PORTO VELHO – Bubuia, a Bienal das Amazônias, com 121 artistas dos oito países da Pan Amazônia e da Guiana Francesa, será aberta no próximo dia três de agosto em Belém (PA). O rondoniense Rafael Prado, 33 anos, filho de migrante nordestino atraído pelo garimpo da Amazônia, e neto de bisavó de origem indígena é um dos contemplados nessa realização da Apneia Cultural, Ministério da Cultura e Governo Federal.

Ele é um artista que trabalha profissionalmente há dez, mas suas primeiras experiências são do período infanto-juvenil.

Atualmente está fazendo uma exposição individual em Belo Horizonte (MG) com o título: “Lembro das árvores de quando ainda nem era nascido” – com 18 trabalhos. Recentemente participou de uma exposição coletiva em Paris: “Sonhar a terra”, no espaço Franz Krajceberg; e no final do ano passado de outra mostra importante no Principado de Mônaco.

Rafael aprendeu bem com as professoras artistas plásticas Leo Bona e Maria Miranda, de Porto Velho

O projeto da Bienal das Amazônias foi concebido com o apoio da Lei de Incentivo Federal à Cultura Rouanet, tendo como patrocinador master o Instituto Cultural Vale e o patrocínio do Mercado Livre.

A temática desta primeira edição é inspirada na obra do poeta João de Jesus Paes Loureiro, de Abaetetuba (PA), que defende o conceito do “dibubuísmo” amazônico, uma referência à relação estética e cultural entre as águas e os corpos que habitam esse território.

Segundo explica a curadora Vânia Leal, os artistas que comporão a mostra foram cuidadosamente selecionados por Sapukai para assegurar a representatividade de todos os povos formadores da Pan-Amazônia.

“Olhar por este caminho traz um projeto de discussão sobre a Amazônia, que leva em conta atores geopolíticos e suas pluralidades culturais. Meu olhar sobre os percursos curatoriais superou fronteiras legais com um compromisso com o contexto Amazônico”, ela enfatiza.

Outra curadora, Keyna Eleison, diz que as obras escolhidas refletem histórias individuais e coletivas dos artistas: “São percursos artísticos bastante diversos, o que, por si só, pode representar um convite interessante para o público.”

Segundo Keyna, será possível observar como as particularidades das obras
“conversam entre si.” “Essa lista de artistas constrói vários movimentos nesse
sentido, várias personalidades nesse lugar, então, ela não tem uma definição
fixa, está no movimento em si. É uma forma complexa e muito sofisticada de
imaginar uma coletividade de trabalhos a serem apresentados num espaço. Não
só num espaço como numa cidade, como em todo um território, que não é só
um simples território, mas um território marcado pela água.”

Uma das obras de Rafael Prado foi selecionada este ano para a revitalização do acervo de Belas Artes, no Museu do Rio de Janeiro, sob a curadoria do diretor Cultural do Museu de Arte do Rio (MAR), Paulo Herkenhoff.

Bom Futuro, 2022. Óleo sobre tela

O artista começou aprendendo com as pintoras e professoras Léo Bona e Maria Miranda, ambas de Porto Velho. “Elas foram a base do que eu faço hoje, e delas vêm o estilo e a vontade que eu tenho de pintar. Posteriormente eu vim para o Rio de Janeiro, estudei no Parque Laje, onde tive aulas com Fernando Chocchiarale, Charles Watson, Marcelo Campos, todos eles curadores e professores universitários envolvidos com artes plásticas”, contou.

Parque Laje localiza-se aos pés do morro do Corcovado, na Rua Jardim Botânico, e foi tombado como local história e paisagístico.

“Desde o início, o que me interessou dentro de uma visão da arte foi o estudo da sociedade e da história da Amazônia”, disse Prado.

“Mitos de minha região”

Rafael inspirou-se também na leitura do livro Orfão do Eldorado, do escritor amazonense Milton Hatoum,  que deu nome à sua exposição.

“Crio um universo que mergulha nas histórias e mitos da minha região. Busco capturar as relações simbólicas que as pessoas estabelecem com a natureza, enquanto abordo os conflitos sociais e ecológicos que assolam nossa região.

É uma forma de explorar a essência das nossas origens e compreender quem somos hoje.

Através da combinação dessas lendas ancestrais com histórias reais e contemporâneas, consigo resgatar antigas crenças em um mundo que foi afetado pelos processos coloniais e pelo discurso do chamado “progresso”. É como se eu unisse os fios do passado e seus saberes com as questões atuais, reimaginando nossa narrativa coletiva e revelando a força transformadora da arte.

Acredito que, ao compartilhar essas pinturas e suas histórias, posso inspirar outros a refletir sobre nossa relação com a natureza, nossa herança cultural e o impacto de nossas ações no mundo ao nosso redor”, disse.

Ouro nos dentes, status

Rafael ressalta a riqueza e a miséria do homem do garimpo. A forte relação do homem com o ouro é uma das características bastante presente no local até hoje: o implante de dentes de ouro na arcada dentária dos garimpeiros é uma particularidade presente na pintura do artista. “O ouro nos dentes é como uma primeira reserva e também uma demonstração de status de que esta saindo da miséria”, diz a sua apresentação.

Ao submergir as memórias desses sujeitos sociais, Rafael quer dizer que o continente amazônico é um território que carrega consigo experiências
ímpares, pouco conhecidas do resto do Brasil. Ou seja, aquilo que o sul e o sudeste ainda não compreenderam: a Amazônia está longe de ser um paraíso exótico.

Sua mostra com o tema assinalou a diversidade de experiências de estar e viver na Amazônia, estabelecendo um debate a respeito da Amazônia, com seus sujeitos geopolíticos e consequências culturais. “Porto Velho aguarda compungido. O Rio Madeira a margem do tempo, dentro da amplidão da noite iluminado pelos faróis das balsas silencia e segue seu curso” – demonstrou o artista.

SERVIÇO
1ª Bienal das Amazônias, em 3 de agosto de 2023
Rua Senador Manoel Barata nº 400
Belém (PA)
Abertura para convidados e autoridades: 4 de agosto a 5 de novembro
Aberto ao público: de terça a sexta-feira, das 9h30 às 19h; aos sábados, de 11h às 20h, e aos domingo de 11h às 18h.
Apoio: Embaixada da França no Brasil, Goethe Institut, Sistema Integrado de
Museus e Memoriais do Pará, British Council, Secretaria de Cultura do Pará,
Governo do Estado do Pará, Fundação Cultural do Município de Belém, Prefeitura de Belém, Museu da UFPA, Universidade Federal do Pará, Fadesp, Instituto Peabiru. Apoio: Prosas, Jurunense, Eletrotransol Tecnologia, Design da
Luz Iluminação e Projeto, Prosas, Eletrotransol Tecnologia, Jurunense Home Center e Light Desing + Exporlux.
Mais informações:
+55 (91) 99212-9882
[email protected]
[email protected]

MONTEZUMA CRUZ
Com  assessoria e fotos cedidas pelo artista

Eldorado é aqui II, 2022. Óleo sobre tela

Ele começou a pintar em Porto Velho, onde conheceu a experiência do pai e de outros garimpeiros

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