MONTEZUMA CRUZ

PORTO VELHO – Desfalcada do quadro mínimo de profissionais geólogos, administradores, economistas e técnicos, a Agência Nacional de Mineração (ANM) se tornou um calo afetado pelo sono letárgico das autoridades impressionadas e deslumbradas com os chifres bovinos e os grãos de soja, mas que não acordam para o caótico setor. Não apenas aquele que lhe garantiu, quase meio século atrás, a mais significativa extração do minério de estanho do País, mas a pesquisa* autorizada e organizada.

Criada pelo ex-presidente Michel Temer em substituição ao antigo Departamento Nacional de Produção Mineral, a ANM só tem nome. Que prestação de contas pode fazer  hoje no estado?

O DNPM sempre trabalhou vinculado ao Ministério das Minas e Energia. Se o governo estadual, parlamentares, e o Ministério Público Federal se dessem as mãos, exigiriam das altas Cortes de Justiça (STF e STJ) total revisão dos royalties minerais e a estruturação do escritório de Porto Velho com recursos humanos.

O esvaziamento dói fundo: “A ANM carece de estruturação, tanto em termos de processos de trabalho quanto na disponibilização de recursos humanos, financeiros e computacionais. Da forma como se encontra, mostram-se precários os processos de planejamento, supervisão e controle das fiscalizações”, relata o Tribunal de Contas da União (TCU).

Processos acumulados desde o DNPM

Onde estão os concursos públicos nessa área tão carente?

A “ponte para o futuro” de Temer “despinguelou” no governo Bolsonaro e no atual já se configura um “salve-se quem puder”. Há como avançar? Há, se houver querer e boa vontade das autoridades, mas será preciso mãos de ferro para revigorar a economia mineral naquilo que ela já fez de maneira organizada.

Três anos atrás, Rondônia teve 72 outorgas de pesquisa, duas concessões de lavra e 28 permissões de lavra garimpeira; e participou com 0,38% da produção mineral comercializada, obtendo R$ 486,5 milhões, superando o Amazonas, que conseguiu R$ 425,1 milhões em 2019. No entanto, perdia para o Amapá, que explora ferro e manganês, cuja movimentação alcançou R$ 778,1 milhões, 0,60% da participação nacional.

De sua parte, o aproveitamento de rejeitos, negócio bilionário, trouxe ao campo mineral do Bom Futuro [maior garimpo de cassiterita a céu aberto no mundo] um grupo canandense avalizado pelo governo estadual.

No começo do seu minucioso levantamento, o TCU constatou logo a deficiência de equipamentos de informática, GPS e Modem para acesso à internet nas viagens de fiscalização da CFEM (Compensação Financeira pela Exploração Mineral), notebooks sem manutenção e expansão da utilização do processo eletrônico sem a correspondente atualização da velocidade dos links de internet.

O TCU notou inconsistências entre os  custos, insumos, valores de produção e o montante recolhido a título de CFEM.

Até 2019 tramitavam em Porto Velho cerca de cinco mil processos minerários ativos e mais de 12 mil inativos.

“O Estado de Rondônia posiciona-se como fronteira de desenvolvimento, principalmente no setor mineral, oferecendo uma boa diversidade de substâncias, tais como os minerais metálicos: Cassiterita, Chumbo, Columbita, Ouro, Manganês, Tantalita, Wolframita e Zinco. Não metálicos: Areia, Argilas Comuns, Calcário (Rochas), Cascalho, Diamante, Gemas, Rochas (Britadas) e Rochas Ornamentais (Granito e afins), além de Água Mineral”, analisava o economista Antônio Teotônio de Souza Neto, em 2020.

Entre os estados do Pará, Minas Gerais, Espírito Santo, Goiás e Rondônia, a ANM enfrenta dificuldades no setor de geoprocessamento. Técnicos aprovados nessa função no concurso de 2006 foram remanejados para outros setores ou cedidos. Superintendências não possuem contratos para manutenção da frota veicular essencial, tendo em vista que as fiscalizações in loco, por vezes, exigem o percurso de grandes distâncias por estradas precárias até endereços rurais com localizações imprecisas.

Alinham-se os componentes caótica situação: no Pará, frota precária e reduzidas; caminhonetes “mais novas” estavam em uso há sete anos, apresentando problemas mecânicos constantes) e dificuldade financeira para locação de veículos. A falta de
veículo apropriado se contrapõe ao significativo passivo de empresas pendentes de fiscalização.

Em Rondônia, apenas três profissionais não conseguem baixar milhares de pedidos de concessão de lavras e pesquisas. Em Minas Gerais, veículos estavam estado precário de conservação e sem manutenção. Em determinadas ocasiões, não haveria nenhum à disposição da arrecadação.

No Estado do Espírito Santo, igualmente, havia veículos com manutenção precária. Em Goiás havia falta ou inadequação da frota veicular e de equipamentos de campo.
das fiscalizações, aumentando a sensação de impunidade entre os mineradores e reduzindo a identificação de sonegadores.

Se a situação melhorar, o “rombo mineral” deixaria de existir. As reservas de estanho em Rondônia situam-se nos municípios de Ariquemes, Campo Novo, Itapuã do Oeste e Machadinho D’Oeste, movimentadas por apenas quatro grupos econômicos. Já o nióbio, mineral estratégico explorado nos estados do Amazonas, Goiás e Minas Gerais, também existe por aqui, mas suas pesquisas, se existem, são ainda misteriosas.

Nosso carro-chefe ainda é o minério de estanho (cassiterita): segundo o Anuário, a Mineração Taboca S/A no Amazonas tem participação de 46,82% na produção estanífera, enquanto a Cooperativa dos Produtores de Estanho do Brasil (em Rondônia e no Pará), 15,97%. Em Rondônia atuam nesse setor a Cooperativa dos Garimpeiros de Santa Cruz Ltda. (7,98%), Cooperativa Estanífera de Mineradores da Amazônia Legal Ltda (6,29%) e Estanho de Rondônia S/A (4,98%).

Cassiterita, minério de estanho

O manganês já dá  visibilidade a Rondônia: sua produção já teria ultrapassado a 30 mil toneladas, superando Mato Grosso (28,5 mil) e Goiás (24,7 mil). Nesse segmento, o Pará lidera com 4,3 milhões de t, seguido de Minas Gerais (548 mil) e Mato Grosso do Sul (494,6 mil). A columbita tantalita totalizou 1,94 mil t e teor de 58,33%, e foi comercializada a R$ 11,2 milhões, conforme ainda o Anuário Mineral Brasileiro.

PORTO ALFANDEGADO E SAL DE UYUNI

Imaginem o único porto alfandegado da região movimentando cargas de minérios e abrindo seus futuros armazéns ao ao Salar de Uyuni (Bolívia), onde se estima a existência de 10 bilhões de toneladas de sal na fronteira do nosso vizinho país com o Chile. Para onde os bolivianos venderiam tanto sal, se não utilizarem a estrutura portuária do norte brasileiro?

Pois bem. Três anos atrás, a direção do porto organizado de Porto Velho estimava a este repórter a estimativa futurista de aproximadamente 5 milhões de toneladas de cargas por ano. Em 2021 o porto faturava R$ 10,5 milhões, e projetava melhorar com a execução do Plano de Desenvolvimento de Zoneamento (PDZ). Essa plano facilitaria novas licitações de áreas em sua extensão de 20 hectares, margeando o rio Madeira.

* Cinco anos atrás, segundo o Relatório de Gestão de 2017, ano base 2016, o País outorgou 3.641 títulos, dos quais 3.522 para autorização de pesquisa (42,8% na região Nordeste), 32 para concessão de lavra (53,1% na região centro-oeste) e 87 para permissão de lavra garimpeira (70,1% na região Norte), com destaque para o ouro nos três tipos de outorga (Anuário Mineral Brasileiro, pg. 10, 11, 34 e 36).

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