Bem mais além do que mero meio de comunicação, o rádio em todo país e muito especialmente no Amazonas, possibilitou a consolidação de gêneros musicais.
Por Abrahim Baze – [email protected]
Bem mais além do que mero meio de comunicação, o rádio em todo país e muito especialmente no Amazonas, possibilitou a consolidação de gêneros musicais e teve importante participação na formação política do Brasil no decorrer da primeira metade do século XX, cuja participação, crescimento e difusão das ondas radiofônicas foram importantes nas décadas de 1920 e 1930.
“… A primeira transmissão do rádio ocorreu em 7 de setembro de 1922, como parte das comemorações que celebravam o centenário da Independência do Brasil. A transmissão teve como destaque um discurso do então presidente da República Epitácio Pessoa. Também foram espalhadas nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro e Petrópolis, aproximadamente oitenta receptores que captavam áreas cercadas no teatro municipal de São Paulo d’O Guarani, de Carlos Gomes. A primeira transmissão por rádio já prenunciava, de alguma maneira, o futuro ligado às manifestações nacionalistas que seriam recorrentes durante o governo Vargas, época de maior expansão das ondas radiofônicas”.¹
Ainda na década de 1920, dois episódios marcaram início da era do rádio no Brasil, de acordo com Sérgio Cabral:
“… A fundação da Rádio Sociedade, por Roquette Pinto e Henrique Morize, em 1923 e a fundação da Rádio Clube no Brasil no ano seguinte. Tais rádios funcionavam por poucas horas em dias alternados, o que não é mencionado, no entanto, de Sérgio Cabral, que nos chama atenção é a sua tese de que o Rádio retira da música popular do terreno do amadorismo e a situa, em um processo paulatinamente, como também, uma forma de profissionalização: isso viria a ocorrer de modo mais acentuado na década de 1930”.
A profissionalização dos cantores do rádio tanto no Brasil quanto no Amazonas veio junto de um repertório, por isso, não foi ao acaso que a partir de 1930 o samba ganha cada vez mais relevância no cenário cultural brasileiro, se torna mais comercial e alia a figura do cantor às ondas radiofônicas, a venda de discos e ao gênero musical, em um circuito que nos permite visualizar uma lógica mercadológica sobre as canções. No entanto, foi a partir deste momento que passam a serem ouvidas com destaque as composições de Ismael Silva, Wilson Batista, Noel Rosa e outros. Como também, surgem grandes intérpretes como Mário Reis e Francisco Alves e as intérpretes Araci de Almeida, Carmen Miranda e Dalva de Oliveira.
“… Como destaca o autor Francisco Weffort, o Governo de Vargas pode ser compreendido pela chave do populismo: um fenômeno político de bastante recorrência na América Latina que tem por objetivo ser paternalista, desenvolvimentista e patriótico. Getúlio operou mudanças significativas na vida do povo brasileiro. Ele tratou de criar um aparelho estatal nas rádios brasileiras, a exemplo do que fez também outro presidente sul-americano Juan Domingo Perón na Argentina. Desse modo a Rádio Nacional que quando criada em 1936, tinha um caráter de empresa privada, tornou-se em 1940, uma empresa pertencente ao Governo Brasileiro. Seu modo de operar por meio de ondas curtas fez com que todo território brasileiro fosse preenchido pelas ondas da emissora. O Estado Novo, mais precisamente o Departamento de Imprensa e Propaganda criou um modelo de programação onde o jornalismo e entretenimento caminhava lado a lado na Rádio Nacional. Desses episódios datam o surgimento da Hora do Brasil, dedicada as notícias do executivo brasileiro, o Repórter Esso, que se plantava de uma inovação as fotos emergentes e grandes nomes musicais que consagraram artistas brasileiros, como a Balança mais não cai e PRK-8, onde atuavam grandes nomes como: Paulo Gracindo, Victor D´Ávila e Brandão Filho e, mais tarde, dar-se início aos radioteatros”.
Por este caminho, cada vez mais focalizar-se na figura do artista e sua representatividade na sociedade, esse processo se transformou com o tempo, mas é o embrião da figura do ídolo que ficou conhecido à época e que não foi diferente em Manaus nos anos 50 na Rádio Difusora e Rádio Baré, fosse por meio dos concursos das rainhas do rádio na década de 1950 que, de igual modo imortalizaram Dalva de Oliveira, Ângela Maria e Emilinha Borba ou pelo fenômeno que se tornou Cauby Peixoto, Orlando Silva e Nelson Gonçalves.
“… O paradigma musical consolidado pelo rádio na primeira década do século 20 no Brasil trouxe à tona muitos nomes da musicalidade, tinha-se um entendimento de que a canção necessitava de ampla orquestra e grande potência vocal e, desse modo está inscrita no imaginário brasileiro”.³
De acordo com as autoras Icléia Barbosa Monteiro e Edilene Mafra, contam a história do rádio na capital do Amazonas:
“… Nos anos de 1920, o Amazonas amargava dias difíceis na economia. Após o fim do apogeu da borracha, a produção amazônica respondia por apenas 5% do consumo mundial de borracha. Mário de Andrade um dos líderes do movimento modernista brasileiro, em visita a Manaus no ano de 1927 afirmou que a capital amazonense de “virgem de luxo” estava se transformando em “mulher fecunda”, metáfora que ilustra a decadência do adutor Paris dos trópicos. Foi nesse cenário de estagnação econômica pós primeira guerra de borracha que antecederam as primeiras transmissões de rádio no Amazonas. Segundo a doutora em educação Icléia Barbosa Monteiro, autora do livro Favor Transmitir ao Destinatário: uma análise semiológica dos veículos de comunicação de massa de Manaus e Rio de Janeiro, clássico e fora das bibliografias básicas das várias disciplinas do curso de jornalismo que surgie no Amazonas em 1927.”.
A Professora Doutora Edilene Mafra acrescenta ainda que, diferentemente, da de maior porte do Brasil, onde surgiu como no Amazonas em 1927 “o rádio nasceu em meio a uma conjuntura…”.
“… A primeira emissora instalada no Amazonas, em abril de 1927 foi a voz de Manãos, que atendia aos interesses comerciais e políticos dos barões da borracha, transmitindo diariamente as cotações do látex no mercado internacional, a situação econômica do país anunciando a chegada e saída dos navios, os feitos do governo e notícias de interesse público. Tinha a prioridade semanal de três dias, entrava no ar nas segundas, quartas e sextas-feiras à noite de 21h às 22h. Afirma ainda, a professora Iclécia Barbosa que após este primeiro impulso de radiodifusão aumentou consideravelmente, o que levou ao investimento de receptores de alta qualidade e sofisticação para época, todos importados. No entanto, impactado pela crise de 1929 que afetou a economia de todo planeta, a emissora pioneira sofreu vários cortes dos governantes e quebrou. Na sequência o Amazonas amargou um período de quase uma década sem rádio. Depois vieram a voz da Baricéa, em 1938, a Rádio Baré em 1939, a Rádio Difusora em 1948 e a Rádio Rio Mar em 1954”.³
Cidade apaixonada – Etelvina Garcia
“… A Manaus dos primeiros tempos da Difusora era uma cidade de pouco mais de 100 mil habitantes, que almoçava em casa, fazia a sesta, passeava de bonde, lia jornal e ouvia rádio.
O rádio fazia parte da vida do povo, que formava dois times inteiramente apaixonados e adversários, o da Difusora e o da Baré. A rivalidade entre as duas emissoras começou no dia da inauguração da Difusora. Em quanto Orlando Silva cantava no auditório da Rua Joaquim Sarmento n. 100, a Baré apresentava Jorge Veiga e Ademilde Fonseca no Cine Teatro Polytheama.
Nesse clima de disputa, a difusora diversificava a sua programação de auditório. O Bonde da Alegria era a grande atração do carnaval de 49, com desfiles da escola de samba Tem Batucada no Morro e apresentação do valoroso Cast-8B, cantando os grandes sucessos carnavalescos do ano, Chiquita Bacana, Jacaré Paguá e Pedreiro Valdemar. O Programa tem gato na tuba, distribuía prêmios para o auditório, ganhavam sem piedade os calouros desafinados e revelando alguns dos muitos talentos que ajudaram a fazer a história do rádio no Amazonas. Semana a semana, as duas emissoras proporcionavam aos seus torcedores inesquecíveis espetáculos com os ídolos do rádio brasileiro. Em resposta ao aparecimento da Maloca dos Barés, a Difusora organizou a Festa da Maloca. Os fãs de Dalva de Oliveira que torciam pela Difusora perderiam a oportunidade de vê-la cantar com o Trio de Ouro na Maloca dos Barés, porque se recusavam a pisar em território inimigo, motivando Josué a contratar a grande estrela para uma temporada exclusiva na Festa da Mocidade.
Os fanáticos torcedores invariavelmente se defrontavam em acirradas discussões, nas escolas, nas bares, nas calçadas da vizinhança, defendendo a sua ou a da sua emissora preferida. Mas, índices de audiência da época diziam que a Difusora era mesmo a mais querida.
A magia do rádio incorporou o marketing dos patrocinadores à programação, que por muito tempo falou na Juó, o louco da rua dos barés 150 e, cantourou o jingle da Sapataria Salvador”.⁴
No traçar desta evolução histórica do rádio e seus cantores, apresentadores, destacamos esse período deste fase do rádio no Amazonas, creditando aqueles que escreveram seus nomes na história do rádio, cuja contribuição singular e preciosa foi artística deste período.
Todas as vezes que surge a oportunidade de se resgatar um pedaço da história, especialmente quando trata-se de um assunto pouco explorado, ganha o “BROADCASTING” valiosos argumentos de decisão na certeza de que, embora fragmentos, vale a pena publicar. Aliás, existem circunstâncias efetivamente interessante a ser mostrado. Nomes como:
Maria de Lourdes – Rádio Baré,
Roque de Souza – Rádio Baré,
Belmiro Vianez – Locutor – Rádio Baré,
Dantas de Mesquita – Locutor,
Jayme Rebello – Locutor,
Corrêa de Araújo – Locutor – Rádio Baré,
Josaphat Pires – Locutor, Produtor – Rádio Ator – Rádio Baré,
Sylvia Lene – Cantora,
Neuza Inês – Cantora – Rádio Baré,
Grace Moema – Cantora – Rádio Difusora,
Tânia Regina – Rádio Atriz – Rádio Baré,
Nice de Alcântara – Rádio – Atriz Rádio Baré,
Carolina Lander – Rádio Atriz – Rádio Baré,
Denizar Menezes – Locutor – Rádio Difusora, mais tarde foi da Rádio Globo,
André Limonge – Locutor Rádio Difusora,
Índio do Brasil – Locutor Rádio do Brasil,
Ayrton Pinheiro Rádio – Ator – Rádio Baré,
Maria Eneida – Cantora – Rádio Baré,
Ray Fernandes – Cantora – Rádio Baré,
Carmen Morais – Cantora – Rádio Baré,
Ângelo Amorim – Cantor – Rádio Baré,
Wilson Dantas – Cantor – Rádio Difusora,
Clóvis Carvalho – Cantor – Rádio Difusora,
Raymundo Sena – Cantor – Rádio Difusora,
Tarub e Seu Joaquim – Humoristas – Rádio Baré,
Jokeide Barbosa – Cantor – Rádio Baré,
Sérgio Roberto – Cantor – Rádio Baré,
Corrêa Lima – Cantor – Rádio Baré,
Alfredo Fernandes – Diretor Artístico, Produtor e Radio Ator – Rádio Baré,
Amélia Vitória – Pianista – Rádio Baré,
Príncipes da Melodia – Conjunto Vocal – Rádio Baré,
Ponce de Leão – Controle Rádio Baré,
Raymundo Mendes – Controle – Rádio Baré,
Waldison Gondin – Controle e Chefe – Rádio Baré,
Hélio Trigueiro – Sanfoneiro – Rádio Baré,
Tânea e Mara (Guiomar Cunha e Lúcia Maria) Vocalistas – Rádio Difusora,
Reginaldo Xavier – Rádio Ator – Rádio Baré,
Danilo Silva – Contrarregra e Rádio Baré,
Chiquinho – Contrabaixo – Rádio Baré,
Fred (Flaviano Limonge) – Rádio Baré,
Rômulo Gomes – Diretor Artístico, Produtor e Rádio Ator – Rádio Difusora,
entrega de prêmios pelo doutor Coqueiro Mendes a Cantora Maria de Lourdes – Rádio Baré,
Almir Silva – Cantor Rádio Baré,
Jorge Araújo – Cantor – Rádio – Baré,
Conjuntos Vocais – Rádio Difusora,
Rosângela Fuentes – Cantora e Rádio Atriz – Rádio Baré,
Lélia de Souza – Cantora – Rádio Baré,
Los Caribes – Rádio Baré,
Marivá Neide – Cantora – Rádio – Difusora,
Maria Medina – Violinista – Rádio Difusora,
José Eduardo – Locutor – Rádio Difusora
e Genésio Bentes – Rádio – Ator e Rádio Baré.
Referências
¹CABRAL, Sérgio. AMPB na era do rádio. São Paulo: Editora Moderna. 1996
²WEFFORT, Francisco. O populismo na política brasileira. São Paulo: Editora Paz e Terra. 1989
³NAVES, Santuza Cambraia. Canção popular no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. 2010
⁴https://portalamazonia.com/cultura/amazonas-ontemehojenasondasdoradio Ierecê Barbosa/Edilene Mafra
⁶GARCIA, Etelvina. Rádio Difusora 50 anos no coração do povo. Editora Norma Cor. Manaus, 1998.
⁷Tapiri Radiofônico. Gráfica do Jornal do Brasil. Rio de Janeiro: Junho de 1952.
Sobre o autor
Abrahim Baze é jornalista, graduado em História, especialista em ensino à distância pelo Centro Universitário UniSEB Interativo COC em Ribeirão Preto (SP). Cursou Atualização em Introdução à Museologia e Museografia pela Escola Brasileira de Administração Pública da Fundação Getúlio Vargas e recebeu o título de Notório Saber em História, conferido pelo Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas (CIESA). É âncora dos programas Literatura em Foco e Documentos da Amazônia, no canal Amazon Sat, e colunista na CBN Amazônia. É membro da Academia Amazonense de Letras e do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA), com 40 livros publicados, sendo três na Europa.
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