Montezuma Cruz

PORTO VELHO – Está começando a investigação de irregularidades nos processos de criação de 11 unidades de conservação no Estado de Rondônia e nos contratos firmados entre a Secretaria Estadual do Desenvolvimento Ambiental (Sedam) e a empresa Permian Brasil Serviços Ambientais Ltda. A fiscalização do Tribunal de Contas do Estado pode ser acionada.

É o que se deduz da nomeação de membros da Comissão Parlamentar de Inquérito da Assembleia Legislativa, a pedido do seu presidente, deputado Marcelo Cruz (Patriota). Ele fundamentou-se no parágrafo 3º do artigo 36 da Constituição Estadual combinado com o art. 33 e pargf.2º do art. 30 do regimento interno, e assim constituiu a CPI, a primeira de 2023.

Desde 2020 a Assembleia recebe denúncias de moradores de algumas dessas áreas criadas durante o governo Confúcio Moura. Elas já haviam alcançado a condição de vilas, a exemplo dos antigos núcleos urbanos de apoio rural criados pelo ex-governador Jorge Teixeira de Oliveira.

Os integrantes da CPI são os deputados: Jean Oliveira (MDB), Cirone Deiró (União Brasil), Alex Redano (Republicanos), Pedro Fernandes (PTB) e Delegado Lucas (PR). O primeiro, até há pouco tempo presidente do Comitê de Mudanças Climáticas, foi denunciado por envolvimento em negociações de áreas de terras em Alta Floresta d’Oeste.

Em seguida, sem alarde, o governador Marcos Rocha afastou do cargo o coordenador de Unidades de Conservação na Sedam, Denison Trindade, ex-sargento da Polícia Militar de Rondônia. A Polícia Federal gravou conversas das quais participam: um fazendeiro, o deputado e o ex-coordenador. O jornal Folha de S. Paulo publicou o teor das conversas, numa das quais é mencionado o nome de um procurador de estado ameaçado de morte.

Cautário ainda tem seringal nativo, cujo látex é disputado por compradores brasileiros, franceses e pelo Irã

A Permian Global foi a vencedora de uma concorrência aberta pelo governo estadual. Passaram-se três anos e, em nenhum momento o governo prestou uma informação sequer a respeito do andamento do projeto.

Quando secretário nacional da Amazônia, antes de ser ministro do meio ambiente, o administrador Joaquim Leite visitou a floresta do Cautário, entre os municípios de Costa Marques e Guajará-Mirim.

Primeiro debate público para discutir REDD+ em Rondônia aconteceu em 2015

Em meados de 2000, foi sancionada a Lei nº 9.885, que instituiu o Sistema Nacional das Unidades de Conservação da Natureza, regulamentando-as em diferentes categorias nos âmbitos federal, estadual e municipal, trazendo em sua base critérios para criação, implantação e gestão destes territórios.

Rondônia possuía naquele ano 49 unidades de conservação, correspondendo a 23% do território estadual. Em 2015, durante o governo Daniel Pereira, realizou-se o primeiro seminário para debater a Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação florestal (RDD+) ou, em inglês, Reducing Emissions from Deforestation and Forest Degradation), o conjunto de incentivos econômicos, com o fim de reduzir as emissões de gases de efeito estufa resultantes do desmatamento e da degradação florestal.

Três empresas se interessaram pela execução do projeto de crédito de carbono na Resex Rio Cautário, ao qual a Sedam se dedicou com mais intensidade, no entanto, apenas duas entregaram a documentação se tornando aptas a concorrer à concessão. Essas empresas apresentaram suas propostas às comunidades. Posteriormente, a Permian Global entregou ao governo estadual a carta de uma empresa automobilística, garantindo a compra de todos os créditos de carbono proporcionados pela Resex.

As UCs dividem-se em dois grupos específicos, constituídos pelas unidades de proteção integral e de uso sustentável, tendo a primeira como finalidade proteger integralmente a natureza, não sendo permitido o uso direto de seus recursos.

Em 6 de outubro de 2021, o Tribunal Pleno do Poder Judiciário do declarou inconstitucional a Lei Complementar Estadual nº 999*, de 15 de outubro de 2018, que extinguiu 11 Unidades de Conservação Ecológica no Estado de Rondônia.

A Assembleia Legislativa recebeu recomendação para extinguir apenas um projeto de lei visando à extinção de apenas a Estação Ecológica Soldado da Borracha. Faltou conhecimento técnico e assim foram acrescentadas mais dez UCs.

Desembargador foi contra extinção e justifica

Nem o pedido de vista pelo desembargador de justiça Miguel Monico fez o Executivo e o Legislativo chegarem a um acordo para esgotar estudos a respeito da revogação das UCs.

Monico, relator do acórdão (decisão coletiva) movido pelo Ministério Público Estadual, concluía que, tanto a unidade de conservação Soldado da Borracha quanto às demais “não podem ser extintas”. Segundo o voto dele, a lei “está viciada formal e materialmente por não haver, no seu projeto, estudo técnico e consulta pública.”

A Lei Complementar Estadual nº 999 viola e afronta as constituições Federal e de Rondônia, e da mesma forma, leis federais, estaduais, descumprindo ainda determinações do Tribunal de Contas.

Se o segundo o voto tornou imperioso impor política pública de gestão socioambiental, a Sedam deveria ter buscado conciliar direitos e interesses ao meio ambiente equilibrado para presentes e futuras gerações. Pelo visto, seu olhar sobre as Unidades de Conservação atende mais à exportação de grãos, “duela a quien duela”.

Mesmo dispondo do mapeamento da realidade agroecológica do estado, obtido por satélite, a Sedam curvou-se impotente, enquanto a própria Comissão de Meio Ambiente e Mudanças Climáticas da Assembleia deu mostras de facilitar a grilagem.

Fotos: Frank Néry e Arquivo Secom

Deixe uma resposta