RO, Segunda-feira, 21 de abril de 2025, às 22:54






Pesquisadores identificam incêndios na Amazônia antes da presença humana

Pesquisadores identificam evidências de paleoincêndios na região de Rondônia muito antes da ocupação humana, indicando influência climática

Professor André Jasper

Um estudo pioneiro conduzido por pesquisadores da Universidade Federal do Tocantins (UFT) e da Universidade do Vale do Taquari – Univates revelou que a Amazônia, especificamente a região de Rondônia, foi palco de incêndios florestais há aproximadamente 43 mil anos.

A descoberta, publicada recentemente, é baseada na análise de macrocarvão encontrado em sedimentos às margens do rio Madeira, pertencentes à Formação Geológica Rio Madeira, Bacia do Abuña. Esse é um dos registros mais antigos de incêndios naturais no Brasil e o primeiro do tipo para o Pleistoceno Superior (estrato do tempo geológico que corresponde ao tempo entre 120 mil e 10 mil anos atrás) na Amazônia.

O estudo The first record of sedimentary macro-charcoal for the Upper Pleistocene of the Amazon foi publicado na revista científica Journal of South American Earth Sciences e é assinado por Karielly Aparecida Borges do Amaral, José Rafael Wanderley Benício, Kellen Lagares Ferreira Silva, Júlia Siqueira Carniere, Etiene Fabbrin Pires-Oliveira e André Jasper (professor e pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Ambiente e Desenvolvimento – PPGAD/Univates).

Evidências do passado  

Os pesquisadores analisaram quatro amostras de sedimentos contendo tecidos vegetais carbonizados, conhecidos como macrocarvão. Esses fragmentos, preservados por milênios, são considerados evidências diretas de fogo. A análise confirmou que o material foi submetido a altas temperaturas, caracterizando a ocorrência de incêndios. Embora as estruturas anatômicas preservadas não tenham permitido identificar as espécies vegetais afetadas, acredita-se que pertençam a angiospermas, grupo que inclui a maioria das plantas com flores.

O mais intrigante é que esses incêndios ocorreram cerca de 30 mil anos antes dos primeiros registros de ocupação humana na região, descartando a ação antrópica como causa. Isso sugere que fatores naturais, como mudanças climáticas e períodos de seca, foram os responsáveis pelo fogo naquele momento. A descoberta reforça a ideia de que incêndios florestais são fenômenos recorrentes na história da Terra, mesmo em biomas como a Amazônia, frequentemente associados à umidade e à densa vegetação.

Contexto paleoambiental  

Durante o Pleistoceno Superior, o planeta passava por flutuações climáticas, incluindo glaciações e períodos mais secos. Essas variações podem ter criado condições propícias para a propagação do fogo, especialmente em áreas onde a vegetação se tornou mais suscetível devido à redução da umidade. Os incêndios, por sua vez, podem ter desempenhado um papel ecológico importante naquele contexto, contribuindo para a renovação da flora e a dinâmica dos ecossistemas.

Em 2020 um estudo similar realizado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) já havia identificado vestígios de incêndios na planície costeira do extremo sul do Brasil, datados entre 38,9 mil e 1.500 anos atrás. A análise de grãos de pólen naquela região indicou uma mudança na vegetação associada a um período de seca, corroborando a hipótese de que alterações climáticas influenciaram a ocorrência de incêndios naturais.

Amazônia: passado e presente 

A Amazônia é frequentemente retratada como uma floresta intocada, mas evidências científicas mostram que ela sempre esteve sujeita a transformações. Atualmente os incêndios florestais na região são majoritariamente associados à ação humana, especialmente ao desmatamento e às queimadas para expansão agrícola.

Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) revelam que apenas em 2022 foram registrados mais de 70 mil focos de incêndio na Amazônia brasileira durante a estação seca. No entanto, a descoberta de incêndios naturais há 43 mil anos destaca que o fogo já fazia parte da história da Amazônia muito antes da interferência humana. Contudo, esse registro não deve ser comparado aos registros atuais de incêndios causados por fatores antrópicos, que vêm causando diversas alterações ambientais e sociais com causas danosas já conhecidas.

A pesquisa abre novas perspectivas para o estudo de paleoincêndios na Amazônia, uma área ainda pouco explorada nas pesquisas científicas. A presença de macrocarvão em estratos geológicos antigos pode ajudar os cientistas a reconstruir cenários climáticos do passado e até mesmo prever possíveis impactos das mudanças climáticas atuais. Além disso, os resultados desafiam a visão tradicional de que a Amazônia sempre foi uma floresta úmida e livre de incêndios.

Futuro 

Os pesquisadores planejam expandir as investigações para outras áreas da Amazônia, na esperança de encontrar mais registros de paleoincêndios. O objetivo é construir um panorama mais completo sobre como esses eventos moldaram a vegetação e os ecossistemas ao longo do tempo.  Enquanto isso, a descoberta em Rondônia serve como um alerta sobre a resiliência da floresta, mas também sobre os riscos impostos pelas mudanças climáticas e pela ação humana.

Fonte: Texto: Redação Univates | Imagens: 

1) Professor André Jasper – Crédito – Divulgação – Antonio Luiz Marini Marchi

2) Micrografias eletrônicas de varredura da amostra – Crédito – Os autores

3) Localização das amostras no mapa do Brasil – Crédito – Reprodução – Google Maps

4) Localização das amostras no mapa da região – Crédito – Reprodução – Google Maps

5) Localização das amostras – Crédito – Os autores

6) Ilustrativa para incêndio – Crédito – Joane Francis – Unsplash


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