RO, Quinta-feira, 02 de maio de 2024, às 11:36



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Mirante da Serra tem pelo menos 300 índios isolados e vai abrir Casa da Memória para lembrar os Amondawa

MIRANTE DA SERRA (RO) – A Casa de Memória do Povo Amondawa (Observatório da Cultura Indígena) deverá ocupar o prédio da Biblioteca Antônio Vieira Sobrinho, na Rua Principal desta cidade a 388 quilômetros de Porto Velho. “Costuma-se dizer que no município de Mirante da Serra há uma aldeia indígena, quando na verdade, ele se situa em terras que até pouco tempo atrás pertenciam aos índios”, assinala a professora Luzeny Amaral, autora da reivindicação do projeto encaminhado à Superintendência da Juventude, Cultura, Esportes e Lazer (Sejucel).

Autores do requerimento ao prefeito Evaldo Duarte Antônio para acomodar o Observatório naquele prédio, os vereadores Adineudo Andrade (PP), presidente da Câmara, e Jozimar Sousa Nerys (PSB) prestaram grande serviço à história indígena brasileira, elogiou Luzeny hoje, 21.

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Na região central de Rondônia, os Amondawa somam 140 índios ainda isolados morando em malocas, e os isolados totalizam aproximadamente trezentos, conforme estimativas da Funai. Os poucos que falam português praticam a “segunda língua”. Quando solicitados a traduzir a palavra portuguesa tempo, eles respondem, simplesmente, kuará, o Sol.

Luzeny Amaral recebeu apoio do presidente da Câmara, Adineudo Andrade, e de outros vereadores

A Funai se aproximou dos Amondawa pela primeira vez em 1986. Relatórios antropológicos revelam que, a exemplo de outros povos indígenas amazônicos, eles caçam e pescam regularmente, e têm roças.

As parcerias com esse futuro órgão municipal serão formalizadas com o próprio Povo Amondawa, Funai, Universidade Federal de Rondônia, Secretaria de Estado da Educação, Pastoral Indigenista da Diocese de Ji-Paraná, Sejucel e Conselho Estadual de Política Cultural (CEPC-RO).

Talvez os Amondawa definissem o espaço do tempo em 24h [na visão do branco], orientando-sepela pela posição do Sol no céu. Hoje, indígenas desse povo procuram esclarecer mais a respeito e há trabalhos em andamento no mundo acadêmico, na Unir, por exemplo.

“O verão está chegando”, “A estação seca vem aí”, “Não vejo a hora de você se casar”. O estudioso não encontra frases desse conteúdo – aplicando o conceito de movimento a um evento temporal – fazendo ligação entre um evento e uma ideia de movimento, constataram os pesquisadores Chris Sinha, Vera da Silva Sinha, Jörg Zinken e Wany Sampaio, das Universidades de Rondônia (Unir) e de Portsmouth (Grã-Bretanha).

O trabalho (em inglês) sobre os Amondawa foi publicado pela revista britânica Language and Cognition.

“Na cultura deles não existe nada similar aos meses ou aos anos. Lá não há relógios, despertadores, agendas, ou calendários. Os períodos mais longos são indicados como subdivisões das estações seca ou chuvosa”, conta Luzeny atenta à antropologia.
Paiajup, memória do Povo Amondawa, conversa com estudantes

Ao criar a Casa do Índio, ou o Memorial da Cultura Indígena (Observatório), o município reconhecerá o local como ambiente de passagem e acolhimento aos indígenas da região e de estímulo à preservação e divulgação da cultura indígena.

Fundadora e integrante do Observatório, apoiada pelo CEPC-RO e pela Sejucel, Luzeny espera que Mirante da Serra possa atrair antropólogos, historiadores, universitários, estudantes e demais interessados pela história de Rondônia e da Amazônia Ocidental Brasileira.

NÃO É UM FENÔMENO ÚNICO

“Não se trata de fenômeno único na histórias das civilizações”, anotou a professora. Conforme a pesquisa das duas universidades, pequenas sociedades rurais, organizadas a partir de uma relação direta com os fatos do cotidiano e os fenômenos naturais sazonais como as estações do ano, sempre conseguiram funcionar sem o auxílio de calendários e relógios, frutos do invento cultural herdado de antigos babilônios.

“Na Constituição de 1988 aparecem diversas menções implícitas e explícitas aos povos indígenas, dentre essas, as contidas no capítulo VIII da Constituição Federal que tutelam a pessoa do índio e suas comunidades”, ela lembrou.

Os Amondawa utilizam instrumentos musicais em seus ritos, entre eles, a flauta. Entre as diversas festividades deles se destacam o Ipuã e o Yrerua. Nesta última, os homens simulam fazer o lançamento de suas flechas enquanto tocam taboca; as mulheres dançam agarradas em seus braços. O “chefe” da festa toca a flauta maior (Yrerua) no meio da roda, conduzindo o ritmo da dança com marcações feitas com os pés.

Em 2020, a assessoria do Ministério da Justiça informava que a Frente de Proteção Ambiental Uru-Eu-Wau-Wau na Terra Indígena de mesmo nome atuava em busca do isolamento coletivo desse povo Amondawa desde o mês de abril, quando a covid-19 se disseminava em Rondônia.

Foram eles que decidiram permanecer na terra, sem o contato com pessoas de fora, e proibiam a entrada de não indígenas.

Na ocasião, o (falecido) coordenador da Frente de Proteção Ambiental, Rieli Franciscato, da Funai, definia com as comunidades indígenas estratégias para proteger a etnia contra o vírus. Ele já havia percebido que os Amondawa cultivavam bem suas roças de mandioca, milho, entre outras.

CRIANÇAS MUDAM DE NOME

Diz o estudo antropológico das universidades de Rondônia e Portsmouth: “Ninguém celebra aniversários: a transição de um momento para outro na vida é indicada por uma mudança de nome e a idade corresponde a um diverso status social no interno da comunidade. diante da ausência de números e da noção abstrata de tempo, esses índios precisam mudar de nome para identificar melhor a fase que estão vivendo.

Por causa disso, várias crianças da tribo são chamadas exatamente da mesma forma. Um menino do clã Mutum, por exemplo, é conhecido por Mbitete ao nascer. Quando tiver um irmão, passará a usar o nome de Kuembu e o próximo recém-nascido será batizado de Mbitete novamente. Os nomes identificam o sexo, a “idade” e o clã ao qual a pessoa pertence e são herdados dos mais velhos pelos mais novos da tribo. Assim como quando ficam mais velhos, esses índios também trocam de nome quando se casam”.

MONTEZUMA CRUZ

Vereadores de Mirante da Serra aprovam a preservação da memória indígena regional                                                                                                                                                                                                             





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