RO, Sábado, 18 de maio de 2024, às 17:32



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Golpe a céu aberto

LÚCIO FLÁVIO PINTO

Os golpes de Estado se originam de conspirações. As conspirações se desenvolvem na clandestinidade. O golpe em gestação neste 2022 é completamente distinto. Ele é público e notório. O ministro da Defesa, que é um general quatro estrelas do Exército, vai ao parlamento e anuncia aos parlamentares que as forças armadas vão montar um esquema paralelo de fiscalização da eleição de outubro.

Ou seja: vão ignorar a lei, segundo a qual o único poder previsto constitucionalmente é o judiciário. Se a apuração ilegal dos militares não coincidir com o da justiça eleitoral, o que acontecerá? Para a resposta influi a presunção de legitimidade das forças armadas como poder moderador, uma ficção jurídica a serviço de uma política obscurantista.

Convocada pelo próprio TSE para acompanhar a votação e apuração, os militares subiram um degrau na escada da credibilidade (autoconferida, é claro), por não terem recebido as devidas respostas aos questionamentos que fizeram extensamente sobre o sistema eleitoral brasileiro com urnas eletrônicas.

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Não por acaso, o presidente da república anunciou que na segunda-feira (mas pode ser no dia seguinte) apresentará “as provas de que nas eleições de 2014 e 2018 houve fraude.” Mesmo que as supostas provas sejam questionáveis ou sejam mesmo inconvincentes, a suspeição estará posta e mais desconfiança dela resultará.

A grave crise política nacional tem causação circular. Se o PT não tivesse abusado do exercício do poder a níveis insuspeitados e escandalosos, considerando-se a legenda do partido, antes da eleição de Lula, Bolsonaro não teria sido eleito presidente e talvez nem fosse candidato expressivo.

Bolsonaro ganhou com o compromisso de fazer o Brasil voltar a antes de 31 de março de 1964. Caoticamente, ele tem se empenhado em cumprir a promessa. No exercício da presidência, a maior parte do seu tempo e da sua energia é para solapar o regime no qual se elegeu, colocando-se acima de tudo e de todos (exceto de Deus, com o qual não mostra ter maior intimidade ou proximidade de fato, apesar da retórica). Sua vontade se tornou elemento constitutivo da sua presidência.

Sua possibilidade de vitória seria remota se tivesse que enfrentar um candidato novo, um político independente. Sem viabilidade eleitoral de uma terceira via (vácuo que o desastrado Sérgio Moro imaginou ocupar), o PT daria aval a essa alternativa. Mas o prepotente, personalista, desgastado (mas ainda carismático e sagaz o bastante para se manter popular) Lula afastou outros nomes e encheu o seu nome de luzes, como se fosse estrela celestial.

Nas pesquisas, Lula está próximo de vencer já no 1º turno. Nos menos de 100 dias que restam para a eleição, porém, iniciativas populistas e artimanhas políticas de Bolsonaro podem mudar a realidade diagnosticada pelas prévias.

Indicador desse elemento foi a consagração da emenda eleitoreira (mas positiva para a parte mais desassistida da população), para a qual oposicionistas, incluindo petistas, deram o seu voto.

Lula se antecipou a esse paradoxo instruindo o povo a pegar o dinheiro (que seria de Bolsonaro, esmaecida a imagem do tesouro federal) e não votar em Bolsonaro. Esperto em ver o imediato, Lula esquece que esse é um raciocínio fatal, que põe em xeque a sua sinceridade e seu compromisso de não usar um terceiro mandato para se vingar dos inimigos e recompor a máquina petista à sua sombra, que foi a razão mais forte da vitória de Bolsonaro em 2018 e é a explicação para o estranho golpe de Estado de 2022, negado, sim, mas já em fase de acabamento.






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