
A mineradora Vale não é uma empresa de varejo, como um supermercado, uma farmácia ou uma quitanda, mas anuncia na imprensa como se fosse. Com as duas páginas inteiras de nos jornais (de Belém, no dia 20) soma três páginas de publicidade em dois dias.
Se não vende diretamente ao consumidor final, como fez questão de ressaltar no primeiro anúncio, por que essa verba publicitária tão grande? É oque perguntaria a Chapeuzinho Vermelho ao Lobo Mau disfarçado de vovozinha, mas se referindo à boca feroz do bicho papão.
A Vale é a maior vendedora transoceânica de minério de ferro do mundo. No ano passado, em baixa, a tonelada do minério alcançou, em média, cerca de 100 dólares. Mas minério com 62% de hematita pura. O de S11D, em Carajás, com 65%, é o mais rico do planeta. De Carajás foram extraídos 230 milhões de toneladas. A produção total foi de 308 milhões de toneladas, também menor.
Mesmo assim, o lucro líquido foi de 96 bilhões de dólares, proporcionando dividendos aos acionistas de US$ 25,6 bilhões. Foi o terceiro maior lucro líquido da história do mercado de capitais brasileiros. O primeiro lugar também foi alcançado pela Vale em 2021: US$ 121 bilhões. A diferença entre 2021 e 2022 foi de US$ 25 bilhões. Em moeda nacional, seriam 125 bilhões de reais. Ressaltando: redução apenas do lucro líquido, que, mesmo menor, deu ganho aos controladores de ações da mineradora igualmente de mais de R$ 120 bilhões.
Números de uma empresa varejista? Obviamente que não. Mas devagar com o raciocínio: um quilo de banana está custando, em média, 10 reais. Mil quilos serão 10 mil reis, o dobro do valor da tonelada do minério de ferro. Claro que não se está pretendendo transformar as minas da Vale em quitandas (embora, em tese, fosse mais lucrativo), mas a empresa não há de querer nos transformar em pensadores primitivos, da geração corta-e-cola.
O retorno que mineradora diz que proporciona ao Estado no qual existe a joia da coroa de ferro mundial é varejeiro (de varejo e de mosca varejeira, além de vasqueiro) comparativamente ao retorno líquido que a Vale obtém por sua competência na extração e venda (em escala menor do que no passado, obtido pela Docenave, também no transporte) do minério. No que ela mais investe são nos meios que lhe permitem, ao mesmo tempo, transformar a grande imprensa em parceira (ou cúmplice) para a formação de opinião pública conforme seus interesses.
Um exemplo do efeito dessa propaganda maciça, própria de empresas que vendem diretamente os seus produtos ao consumidor final, o leitor pode alcançar lendo o noticiário dos principais jornais do país logo em seguida à divulgação dos resultados econômicos, financeiros, de produção e tudo mais da mineradora. É quase uma reprodução integral dos press-releases da companhia. É a hora do toma lá para manter o dá-cá.